Aquela Moça
Aquela Moça, Francine S. C. Camargo, Guaratinguetá, Editora Penalux, 2018, 124 pág. |
"Quem fecha os olhos,
consegue acobertar incêndios por algum tempo.
Mas alguns lenços jamais
enxugarão grandes inundações."
Aquela Moça é possível que seja
eu, você, sua vizinha, sua prima, sua amiga, sua irmã ou sua mãe. Pode ser
qualquer um. O novo livro de Francine S. C. Camargo, uma compilação de 36
contos, aborda fatos do cotidiano, revestindo-os de poesia e lirismo, e
trazendo reflexões sobre os mais diversos assuntos.
A capa do livro merece um destaque inicial. Para
leitores que costumam julgar o livro pela capa, este certamente agradará. A ilustração
é viva, atraente e instiga a curiosidade pelo conteúdo do livro, onde o leitor
encontrará uma fonte boa e de tamanho adequado, o que tornará a leitura muito
agradável.
Os 36 contos abordam temas como a corrida contra
o tempo que corre depressa e sem parar; a descoberta de uma paixão ou uma
paixão platônica adolescente; lembranças da infância; a ausência do animal de
estimação cuja partida deixou saudades; maternidade e vivências sobre a
medicina. Alguns têm até um toque de terror ou causam arrepios, tamanha
descrição perfeita das cenas relatadas e narrativa diferenciada. Algumas
narrações emocionam, outras são engraçadas, e outras são bastante profundas. Há
simplicidade na escrita em alguns contos e, na maioria deles, muita
complexidade no vocabulário, o que enriquece a leitura e leva a sua reanálise
para que se compreenda melhor a mensagem central.
Dentre todos os contos, gostaria de destacar
seis. O primeiro deles é o conto “A
primeira”, que traz a temática da primeira menstruação sob o ponto de vista
de uma menina-moça. De forma peculiar, demonstra a aflição e a curiosidade de
uma nova flor que desabrocha para o crescimento, para a vida, para o amor. Inevitável,
como mulher, não se identificar.
Outro conto muito interessante é o “O exército de baratas”, relatando uma
história ou estória ocorrida numa madrugada longínqua. A decisão se é uma
história real ou fantasiosa ficará por conta de cada um quando terminar de lê-lo.
Já “Quatro
Anos de uma alma antiga”, eterniza o olhar e as frases de uma criança com
toda sua inocência e pureza em diálogos com sua mãe. Em seu mundo infantil tudo
é possível: “Quando a Lua aparecer, vai
nascer uma flor e a Lua vai virar uma bailarina sem boca e vai dançar em cima
da flor."
Merece destaque também “Você nasceu para quê?”. De um papo online entre amigos, a autora levar o leitor, de maneira sutil, a se
aprofundar e se fazer essa pergunta ao finalizar sua leitura.
E um tema central permeia os dois últimos contos
aqui destacados: “Depressão, terapia e
alguns lenços” e “Aquela Moça”, o
qual dá título à obra. A autora consegue com esses dois contos tornar um pouco
mais leve o que é naturalmente denso e muito sofrido: a depressão e a solidão.
E nos convida a refletir sobre o assunto, a voltar os olhos para o outro, a
tocar as feridas das almas humanas e ajudar a curá-las.
Enfim, para quem gosta de contos, Aquela Moça é imperdível. Francine, por
meio de um olhar único e escrita impecável, consegue extrair poesia do
cotidiano, da fantasia, da dor, da perda, de conflitos existenciais e até mesmo
de um papo entre amigos, e nos presenteia com uma leitura envolvente e de muita
reflexão.
Quando se nota, já se leu 60 páginas sem
interrupção. Não dá vontade de parar. E você pode escolher lê-lo do inicio, do
meio ou do fim ou simplesmente optar por um título que chame atenção. E mais, você pode lê-lo novamente daqui a 10
anos e, independente do seu momento na vida, você vai se identificar certamente
com alguns de seus contos.
“Eu acho que nasci
para me descobrir como lua, em suas várias faces, crescimento, plenitude,
envelhecimento e renovação / renascimento. Lua clara, lua escura e, a partir
dessas fases, tentar despertar o mesmo no outro. Seja por meio da maternidade,
do amor, da medicina, da amizade...” Ou de um livro como Aquela Moça.
Está tudo ai. Está tudo aqui para nós. É
atemporal, é universal. Particularidades de Francine S. C. Camargo. Vale a pena
conferir.
Francine também é autora de Mãos Livres, lançado em 2016 pela Editora Chiado e administra o blog www.papodefran.com, onde publica seus contos.
Neide Costa
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